Page 7 - Informativo Cembra - Novembro 2023 - Nº 12
P. 7

Um oceano previsível

           A ciência que precisamos por um oceano que queremos


                                                                                         Olga Sato (IOUSP)

      Não  poderia  me  inspirar  para  escrever  este  artigo  numa  ocasião  mais  apropriada:  durante  uma
      expedição oceanográfica a bordo do Navio Oceanográfico Alpha Crucis, do Instituto Oceanográfico da
      Universidade  de  São  Paulo.  Esse  foi  mais  um  dos  cruzeiros  do  projeto  SAMOC  Basin-wide  Array
      (SAMBAR),  um  projeto  financiado  pela  FAPESP  e  coordenado  pelo  Prof.  Dr.  Edmo  Campos  e  por
      mim,  Olga  Sato,  no  momento  a  pesquisadora-chefe  da  expedição.  Nosso  objetivo:  manutenção  de       Matéria:
      instrumentos instalados no fundo do Oceano Atlântico na latitude de 34,5◦S. Ecossondas invertidos
      também  conhecidos  como  PIES  (do  inglês  Pressure  Sensor  Inverted  Echo  Sounder)  seriam
      recuperados e relançados para darmos continuidade à obtenção de dados através de medições que
      envolvem toda a coluna d’água desde a superfície até o fundo, Figura 1. Esses dados são utilizados
      para  obtermos  perfis  de  temperatura  e  salinidade  que,  durante  este  cruzeiro,  chegou  a  atingir
      profundidades maiores que 4750 m. A partir desses perfis, podemos obter informações importantes da
      dinâmica  oceânica  como  variações  das  correntes,  estrutura  de  massas  d’água,  propagação  de
      ondas,e processos de instabilidade, entre outros. Todos esses processos estão relacionados ao papel
      do Atlântico Sul na determinação do clima do planeta.


      O  Atlântico  Sul  tem  características  especiais:  ele  interliga  três  das  maiores  bacias  oceânicas:  o
      Pacífico, o Índico e o Atlântico Norte. Essas bacias são conectadas por uma circulação de larga-escala
      e de longo-termo conhecida com a Circulação de Revolvimento Meridional, também chamada como
      MOC (do inglês Meridional Overturning Circulation). A MOC no Atlântico é caracterizada pelas trocas
      de massa e calor através dos hemisférios Norte e Sul por um fluxo para o Norte mais quente e salino
      nas  camadas  superiores  e  um  para  o  Sul  de  águas  mais  frias  através  das  camadas  profundas.  A
      descrição desses processos só foi possível por causa do conhecimento acumulado das últimas seis
      décadas de observações oceanográficas globais, sendo que a maior parte delas foi obtida de forma          Um oceano previsível - A ciência que precisamos por um oceano que queremos
      mais  organizada  a  partir  da  década  de  1990  com  o  estabelecimento  do  World  Ocean  Circulation
      Experiment (WOCE).


      A  intenção  desse  preâmbulo  é  mostrar  que  a  concretização  de  um  oceano  previsível  passa  pela
      necessidade  da  utilização  de  dados  que  retratem  o  estado  do  oceano  com  resolução  temporal  e
      espacial adequados e que haja um planejamento para que continuem sendo obtidos. A observação
      dos  processos  oceânicos,  seja  na  forma  de  medições  in  situ  ou  remotamente  através  do  uso  de
      satélites  é  o  que  propicia  o  embasamento  teórico  para  a  evolução  do  conhecimento.  Num  cruzeiro
      oceanográfico,  cuja  missão  deve  ser  guiada  pela  aplicação  das  melhores  práticas  observacionais,
      devemos obter dados in situ que retratemo estado do oceano fielmente. O método científico é a base
      filosófica que fundamenta a pesquisa científica. Dentro desse escopo, os dados serão utilizados para
      testes de hipóteses que poderão gerar novos conhecimentos. Embasados por dados observacionais,
      modelos de circulação geral dos oceanos e de previsão serão aprimorados. E este é o motivo pelo
      qual a comunidade científica necessita de grandes programas observacionais como o WOCE, GOOS,
      TOGA-TAO, PIRATA, TOPEX/Poseidon, Pathfinder, GHRSST, Argo, entre outros.

      Vale notar que essas tarefas não devem ser o trabalho de um pesquisador só, que terminaria quando
      não houvesse mais interesse ou capacidade. É uma obra que deve envolver a comunidade científica,
      instituições, e países. O oceano previsível não existirá por acaso e nem poderá ser sustentado se não
      houver um fluxo contínuo de informações e fomento. O oceano só será previsível, quanto melhores
      forem  a  quantidade  e  a  qualidade  dos  dados.  O  oceano  previsível  será  sustentado  com  a
      disseminação  dos  dados  para  que  a  sociedade,  como  um  todo,  possa  usufruir  do  conhecimento
      agregado.



             Informativo CEMBRA                                        Nº 12 - Edição Semestral                  07
   2   3   4   5   6   7   8   9   10   11   12